Falta eficácia às leis ambientais  

Falta eficácia às leis ambientais  

A defesa das condições ambientais é obrigação do Estado e esperança da comunidade. Um governo verdadeiramente consciente tem por obrigação tudo fazer para que a legislação sobre meio ambiente seja respeitada. 

O Brasil é um dos países que mais leis tem sobre preservação da natureza, e em contrapartida grande maioria das autoridades é inepta, conivente ou incapaz de fazê-las cumprir! 

A legislação sobre as áreas especiais do litoral que em tão boa hora foi promulgada para melhorar as condições ambientais dos balneários paranaenses, corre hoje. risco de ser invalidada pela pressão econômica e pela vulnerabilidade do poder público constituído. 

Apesar da lei estadual n.º 7389 de 12 de novembro de 1980 considerar as áreas. especiais, os poderes públicos de alguns municípios iniciaram o boicote da mesma concedendo alvarás de construção de forma altamente suspeita e mesmo corrupta em troca de favores pessoais, sem que o Estado tivesse intervido. 

A participação do Estado no problema das áreas especiais não fere a autonomia municipal, uma vez que o município não tem poderes ou capacidade de controle em âmbito regional integrado. A lei não pretende dualidade de atribuições administração. Ao Estado compete fiscalizar a execução da lei. revisando os atos do município no que concerne ao uso do solo das áreas especiais, isto é, entre outras causas os coeficientes de aproveitamento, as taxas de ocupação máxima e os limites máximos de altura dos edifícios, ficando as demais posturas únicas é exclusivamente da alçada do município. 

O governo do Estado sob hipótese alguma pode abrir mão da preservação das áreas especiais do litoral, sob protestos de inconstitucionalidade, uma vez que já existe precedente de jurisprudência que garante ao Estado poderes para legislar sobre áreas especiais, como aquelas referidas na Lei Estadual 7389. Esta lei e muito sábia no que concerne a preocupação com ambiente consequentemente com bem-estar da comunidade. 

Por quê? 

Por muitas e muitas razões:  

Vejamos: as áreas lindeiras às baias e rios interessam à procriação e desenvolvimento de animas aquáticos utilizados na alimentação do homem, além de darem condições da fixação do pescador na região litorânea. 

A degradação ambiental, sem dúvida trará problemas socioeconômicos fazendo com que a população migre para as cidades e aí a se marginalizem. 

A ocupação das Vertentes dos Morros traz problemas de deslizamentos e de infraestrutura onerosa, além de reduzir os recursos hídricos e destruir a paisagem da floresta pluvial tropical, sacrificando o aspecto estético-paisagístico como um dos grandes atrativos turísticos.  

Vejamos agora a parte mais importante das áreas especiais, onde as pressões econômicas são maiores. Alguém já questionou nestas áreas o problema de poluição?  

A Secretaria do interior já se posicionou através dos seus órgãos competentes? 

 Ao que parece, ainda não há uma definição interdepartamental, cabe portanto à esta Secretaria uma parcela de grande responsabilidade para que a lei seja cumprida. 

Qual a população dos municípios? 

 Qual a taxa máxima de afluxo durante as temporadas?  

Qual capacidade do sistema de esgotos? 

Qual a taxa atual de poluição das águas junto à praia?  

Qual o aspecto sanitário da orla marinha? Entre muitas outras perguntas. 

Quando se se quer revogar a lei ou fazer concessões generosas ao poder econômico não se pergunta como fica o usuário da infraestrutura do balneário! 

Ele é desconsiderado e menosprezado, ao empresário interessa a lucro imediato e a especulação imobiliária. Ao município interessa a arrecadação de impostos, A eles pouco importa se as águas do mar ficarão contaminadas ou impraticáveis ao banho. Não podemos tolerar que os balneários paranaenses tenham a mesma sorte de outros balneários brasileiros famosos pelos seus espigões e pela poluição da praia com dejetos de esgotos. 

O município e o empresário alegam que o cumprimento da lei trará desemprego e problemas sociais. Esta assertiva constitui uma fachada de hipocrisia atrás da qual se escondem os especuladores da operação imobiliária. O atual programa de edificações é exageradamente seletivo, favorecendo apenas as classes com maior poder aquisitivo, aparentemente gerando os maiores lucros em detrimento das condições ambientais e da qualidade de vida. A mudança da filosofia de ocupação do solo trará maiores benefícios aos municípios e à classe média, além de ocupar a mão-de-obra disponível em programas mais populares e menos onerosos. 

 
E o problema de esgotos como fica? 

A população fixa de Matinhos está em torno de 10.000 a 12.000 habitantes, podendo atingir nas temporadas até mais de 100.000 veranistas. O atual sistema de esgoto prevê em sua primeira etapa atendimento de 10.000 moradores e quando terminado 30.000 habitantes. 

O atual sistema, implantado em terrenos arenosos, teve sua capacidade de operação reduzida em virtude de infiltrações causadas pela liquefação de areias hidrodinamicamente excepcionais. Assim o número de habitantes atendíveis pelo sistema sofreu uma redução. 

O sistema de esgoto de Matinhos não tem condições de atender um adensamento populacional. Este fato, em si só, invalida perante a opinião pública a pretensão dos empresários, uma vez que devemos prevenir a poluição das águas a todo custo. Exigimos que o governo não ceda as pressões que vem sofrendo, a bem da causa ambiental. 

O máximo de adensamento (100 habitantes/hectare) permissível parece não poder ser atendido antes que existam condições prévias de tratamento de esgoto e do lixo. 

A Adea é de parecer contrário à transferência. dos encargos estaduais de controle de áreas especiais, para exclusiva competência dos municípios, uma vez que os mesmos não dispõem de infraestrutura adequada, atualmente existente nos vários órgãos do governo. Adea de parecer que a lei deve ser mantida em vigor. apesar de terem sido sugeridos alguns ajustamentos que tentam burlá-la ou mesmo torná-la ineficaz, em detrimento dos direitos dos usuários dos balneários paranaenses, que ficarão sujeitos a deterioração ambiental. 

João José Bigarella, geólogo, professor da UFPR e presidente da ADEA; Winston Ramalho, arquiteto e professor UFPR 

Gazeta 25/06/83 

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