A recuperação do meio ambiente degradado pelo mau uso e espoliação dos recursos naturais, tem sido preocupação constante da Adea, desde sua fundação em 1974. Sabemos da realidade da situação ambiental do Estado do Paraná, o qual desenvolveu-se a custa do sacrifício de extensas áreas outrora agriculturáveis e produtivas. Desenvolveu-se também a custa da destruição quase que total de sua cobertura florestal, principalmente daquela representada pela floresta de araucária. De Estado produtor de madeira o Paraná passou a importador, apesar de possuir quase a metade de seu território com vocação para a silvicultura.
O que o Estado vem fazendo para recuperar o ambiente deteriorado?
Praticamente nada! Aliás, recuperar os « desertos esverdeados » não é nada fácil e, via de regra, extremamente oneroso. A solução deste tipo de problema tem sido uma das metas do trabalho técnico da Adea.
Durante vários anos, esta associação cooperou com a Comec, realizando levantamentos cartográficos de vários aspectos ambientais desde o substrato físico do terreno até o uso do solo. A Adea contou com a participação de um grupo de especialistas, de cujo trabalho resultou a sugestão da organização de uma escola de ecotécnica que viesse a recuperar os marginalizados provenientes do campo ou, em outras palavras, reduzir de certo modo o êxodo rural. Esta escola seria montada em moldes não convencionais.
Esta sugestão foi encaminhada tanto ao governo anterior como também ao atual. Dentro da atual administração, as opiniões dividiram-se de sorte a prejudicar o início da implantação de uma escola de ecotécnica « experimenta».
Embora a Adea conte com a boa vontade de alguns administradores, ela encontrou outros setores públicos que passaram a sabotar a ideia inicial.
Fomos informados de que o governo pretende “recuperar” os terrenos e os bóias-frias através da organização de fazendas coletivizadas semelhança do que foi feito na Rússia e em outros países de ideologia comunista. Sabemos que isto não funciona e praticamente inviável.
O direito do cidadão possuir uma propriedade ter liberdade de expressão é sagrado! Ele precisa ter estímulo e não ser escravo do Estado.
Não interessa uma ideologia que cerceie a liberdade individual teoricamente garantida pela Constituição!
Foi censurada e apreendida uma publicação da Adea por não estar dentro da ideologia pregada por um setor da administração tida como democrática e que solicita a participação comunitária!
Que horizontes para o futuro?
Aparentemente todo o esforço de um trabalho da Adea, realizado no decorrer de muitos anos, encontra-se impossibilitado de ser utilizado em prol da comunidade.
Este fato preocupa a Associação de Defesa e Educação Ambiental, uma vez que assistimos à continuação do assustador fluxo marginalizante provocado pelo éxodo rural, sem que possamos auxiliar efetivamente a solução do problema, devido ao cerceamento da liberdade de expressão!
No processo de degradação ambiental, os homens expulsos da terra ou continuam ligados o campo ou abandonam a área rural.
No primeiro caso passam a favelar a pequena cidade onde são esporadicamente agenciados para prestar serviços na área rural. Sua remuneração temporária não lhes permite viver condignamente a sociedade. O ambiente familiar deteriora-se. Os filhos não recebem educação adequada. Vivem num ambiente promiscuo
repleto de maus exemplos que podem conduzi-los facilmente à carreira do crime.
No segundo caso, os homens expulsos do campo, bem como muitos bóias-frias, abandonam a vida rural na vã esperança de encontrar um paliativo para seus sofrimentos na cidade grande!
Transformam-se nos favelados, marginalizando-se ainda mais. Despreparados para enfrentar o ambiente urbano, sem qualquer qualificação profissional, passam a constituir um onus à comunidade.
Acostumados ao trabalho no campo, lavrando • terra, os antigos bóias-frias não possuem noções de higiene, colaborando assim para incrementar o índice de poluição urbana. Seus rendimentos, ou os da família, são insuficientes, o que faz com que grande número deles sofrem vicissitudes que acabam levando-os a abraçar o crime!
Os homens expulsos do campo chegam assim ao ápice de sua degradação psicológica qual teve origem nos processos de empobrecimento e de erosão dos solos.
Entretanto, em muitos destes homens simples, verdadeiros escravos de uma sociedade passiva, negligente e mal administrada, encontram-se valores humanos dotados de princípios de honestidade! São recuperáveis, desde que exista estrutura adequada a reeducação, recuperação e futuro relocamento no campo.
De nada adianta lutar contra os efeitos do problema. Necessitamos atacá-lo em suas origens, uma delas uso inadequado do solo tropical ou subtropical extremamente frágil.
O cenário da paisagem rural com lavradores famintos, abandonados ou das favelas expandindo-se nas áreas urbanas, pode e deve ser erradicado. Para isto, é necessário que se queira verdadeiramente resolver o problema. O homem não pode continuar ignorante, analfabeto e
desqualificado, sofrendo toda sorte de pressões econômicas
A Adea apresentou uma proposta concreta, que visa uma seleção do bóia-fria, transformando-o, dentro de certo prazo, em participante de um sistema produtivo baseado no cooperativismo (agrovila-empresa) orientando, para a recuperação dos solos das áreas degradadas, para a despoluição das águas e para a renovação das condições básicas de vida.
A proposição da Adea, fundamental na implantação da Escola de Ecotécnica. deve ser analisada com muita propriedade, responsabilidade, desprendimento e, sobretudo, sem pretensões imediatas,
porque constitui um processo gradativo de solução a médio e longo prazo.
Trata-se de uma proposta que não fabrica “votos », portanto, sem interesse eleitoreiro, mas merece ser considerada
prioritária pelos politicos.
Sem dúvida, a solução dos problemas sócio-econômicos da marginalização do retirante rural requer, por parte do poder público,
aproximação não convencional. Devemos tentar a aproximação de uma Escola de Ecotécnica nos moldes preconizados pela Adea
pelo menos como uma tentativa experimental. Esperamos que esta experiência venha a dar subsídios para a resolução de dois problemas cruciais do Estado,
isto é, o do homem marginalizado e o da recuperação do solo agrícola.
Com isto, esperamos que regiões atualmente decadentes pobres possam ser recuperadas.
tornando-se novamente produtivas e férteis, graças a aplicação de metodologia educativa apropriada.
Senhor governador, temos condições de resolver nossos problemas ambientais, com nossa tecnologia, dentro de princípios democráticos. E só querer afastando a corrupção de muita má vontade!
(João José Bigarella, geólogo, professor da UFPR • presidente da ADEA).
Gazeta do Povo, 12/1/84
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